domingo, 1 de abril de 2018

Programação no CLP com diagrama de blocos de função - Malha de Medição de Nível

Há tempo estamos convivendo com a automação industrial. Está presente no nosso cotidiano. Sem percebermos, a porta do aeroporto abre-se com a nossa aproximação; a garrafa de água mineral é envazada sem a presença do homem; o comandante aciona o piloto automático do avião e a automação encarrega-se de nos levar ao destino; armazenamos fotos na nuvem e há programas inteligentes que separa as fotos por evento, por pessoa ou por lugar. Até nos brinquedos encontramos automação, por exemplo, no conjunto de robótica da Lego tem um mini controlador programável versátil. Podemos ser aversos a algum tipo de automação. Todavia, não podemos escapar dela.

Um dos equipamentos utilizados na indústria para promover a automação dos sistemas e dos processos é o controlador programável. No meu canal Luciano Lucena - Educação Profissional no YouTube tem uma vídeo aula sobre Controlador Programável (https://www.youtube.com/watch?v=-A6HUDW_ads) dividida em três partes. Vale a pena assistir.

Os fabricantes de controladores programáveis facilita nossa vida na hora de programar a máquina, permitindo alguns recursos para isso: diagrama Ladder, diagrama de blocos e linguagem de programação. Neste artigo, focaremos na programação utilizando diagrama de blocos de função (FBD). Antes, faremos um brevíssimo resumo sobre portas lógicas, amplamente utilizadas na programação de equipamentos lógicos.

A Fig. 1 traz um resumo das portas lógicas mais usuais.

Fig. 1: Resumo das Portas Lógicas
Podemos associar as portas lógicas para fazermos circuitos lógicos e estes acionarem, desligarem, ligarem, movimentarem, entre outros, elementos passivos e ativos nos diversos segmentos industriais ou não.

Mas, como funciona o controlador programável? Vejamos a Fig. 2.

Fig. 2: Constituição básica de um Controlador Programável típico
Assim como em um computador, o controlador programável precisa de uma fonte de alimentação para funcionar e possui unidade central de processamento (CPU), banco de memórias ROM, RAM e suas variantes, processador, uma interface homem máquina (IHM), além de diversos tipos de cartões de entrada e de saída de dados, quer sejam digitais (discretos) ou analógicos.

Após a correta parametrização das informações e correta programação do controlador, podemos, por exemplo, apertar uma botoeira na sala de controle de uma indústria que fica muito distante da planta de processo (campo) e, mesmo à distância, ligarmos um motor de uma bomba de transferência de fluido. Como isso ocorre? A botoeira é uma entrada discreta. Fisicamente, ela está conectada a um canal de um cartão de entrada do controlador programável. O controlador, por sua vez, faz uma varredura das informações dos cartões de entrada e de saída em milésimos de segundos, a fim de atualizar sua tabela de ações. Ao perceber que o canal mudou de nível, por exemplo, de desligado (nível lógico 0) para ligado (nível lógico 1), o controlador atualiza aquela informação na sua tabela e, por meio do programa inserido nele, faz a mudança de nível lógico em um canal de saída, devidamente endereçado para aquela bomba que se deseja ligar. Interessante, não é?

Agora, vamos praticar. Analisem a malha de um processo de medição de nível da Fig. 3.

Fig. 3: Malha de medição de nível
De acordo com a norma internacional ISA 5.1, a malha tem um transmissor indicador de nível (LIT), conectado diretamente ao tanque TQ-01. Este transmissor envia um sinal elétrico de corrente, variando de 4 a 20 mA, para um conversor de sinal (LY) elétrico em sinal de dados (software), virtual, que se encontra no controlador programável (um canal de um cartão de entrada) e para um indicador de nível (LI) virtual que está na tela do supervisório na sala de controle. Ainda no controlador programável, temos duas chaves de nível baixo (LSL) e alto (LSH), também virtuais, que enviam sinal de dados a dois alarmes de nível baixo (LAL) e alto (LAH) que estão na tela do supervisório em uma sala de controle. Além de enviar sinal para os alarmes, dois conversores (LY) de sinal de dados em sinal elétrico recebem informações para atuarem as duas válvulas solenóides (LY 1 e LY 2) que estão conectadas no atuador pneumático das duas válvulas ON-OFF da malha (LV 1 e LV 2), na entrada e na saída do tanque, respectivamente.

A programação no controlador programável será assim: temos uma entrada analógica que receberá 4 a 20 mA do LIT. Quando o nível do tanque estiver baixo, a LSL acionará a LY 1 que abrirá a válvula LY 1, permitindo a entrada de líquido no tanque. Esta válvula permanecerá aberta até o nível atingir seu valor considerado alto e atuar a LSH. Neste instante, a LY 1 desenergiza, fechando a LV 1 e a LY 2 energiza, abrindo a LV 2, que tem como objetivo esvaziar o tanque. A partir daí o ciclo se repete.

Para exercitarmos, o valor de nível baixo dar-se-á com 6 mA e o de nível alto com 18 mA na saída do LIT. Utilizei um temporizador (TON - conta para energizar) de 2 s antes da atuação das válvulas solenóides com o objetivo de o sistema certificar-se de que não foi algum ruído ou distúrbio na malha causado por balanço do líquido dentro do tanque, por exemplo. Também utilizei uma porta lógica Ou Exclusivo com duas entrada, sendo uma com a informação oriunda do conversor analógico-digital após o LIT e a outra entrada com a informação do valor esperado para a condição normal de operação. Explico melhor: na maioria dos casos, utilizamos o nível lógico 0 para detectarmos uma anormalidade na malha de controle, pois este representa equipamento desligado, falta de fase, botoeira desligada, resistor elétrico desligado, válvula fechada, entre outros. Já o nível lógico 1 representa que o sistema está normal e é o inverso dos exemplos que acabei de citar. Assim para o exemplo em questão, esperamos que o nível do tanque esteja sempre normal, ou seja nível lógico 1 em uma das entradas da porta lógica Ou Exclusivo.

É preciso também, explicar duas palavras que são comuns na programação de controladores programáveis: By Pass e Override. A tradução, no pé da letra, é desvio e sobrepor, respectivamente. E apesar de cada ação desta representar um sinal forçado em algum item do programa, eles tem consequências diferentes. O By Pass atua na entrada do controle e/ou intertravamento e o Override atua diretamente no sinal de saída, independentemente do comando programado no controle e/ou intertravamento.

Para simular o controlador programável, utilizei o programa Zelio, baixado do site da Schneider Electric. Vejamos a Fig. 4, que mostra a tela em FBD do programa do controlador programável.

Fig. 4: Tela do programa Zelio referente ao controle da malha de medição de nível
O LIT está representado por uma entrada analógica (resistor variável ou potenciômetro). Os valores de nível baixo (6 mA) e nível alto (18 mA) estão representados pelos blocos de números fixos NUM. Antes das portas Ou Exclusivas, inseri um Schmitt Trigger que terá saída com nível lógico 1 quando a corrente do LIT atingir 18 mA e nível lógico 0 quando a corrente do LIT atingir 6 mA. Na sequência, temos as duas portas lógicas OU Exclusivo, com o valor esperado 1 para cada situação de nível (LSL e LSH) e depois o temporizador, setado em 2 s. Após o temporizador, está um bloco que representa o comando de By Pass. A Fig 5 mostra o que tem dentro do bloco. Percebam que o By Pass inibe o comando da entrada da lógica. Vejam a diferença para o bloco Override. A Fig. 6 mostra o bloco. O comando de Override 0 ou 1 atua diretamente na saída, ou seja, diretamente nas válvulas solenóides, independentemente de qualquer comando que tenha atuado antes dele.

Fig. 5: Bloco do comando By Pass

Fig. 6: Bloco do comando Override

Vejamos a simulação que foi separada em três vídeos. Antecipadamente, peço-lhes desculpas pela falta de qualidade dos vídeos, pois não estou com os meus acessórios de filmagem. No entanto, é possível entender a mensagem.








Resumindo:


Fig. 7: Válvulas atuadas para encher o tanque
O tanque encherá enquanto o LIT enviar sinal de corrente elétrica menor do que 18 mA, ajuste de nível alto.


Fig. 8: Válvulas atuadas para diminuir o nível do tanque
Quando atingir o nível alto, a válvula LV 2 permanecerá aberta, esvaziando o tanque, enquanto o LIT enviar sinal de corrente elétrica maior do que 6 mA, que é o valor ajustado para nível baixo.

Espero que tenham gostado do artigo e agradeço a atenção de todos. Tudo de bom!




domingo, 25 de março de 2018

Relação entre a Vazão e a Pressão Diferencial em uma malha com elemento deprimogênio

A medição de vazão na indústria é muito importante. Como a vazão é a quantidade, que pode ser volume, massa ou peso, de um fluido no tempo, é possível medirmos o volume para encher um tanque, um vaso, uma esfera. Também podemos quantificar quanto de volume foi consumido ou transportado. Um exemplo doméstico é o medidor de água da nossa casa. Nele é possível quantificar o volume consumido na residência em um determinado tempo (dias).
No entanto, a medição volumétrica de vazão nem sempre é tão simples. Depende do tipo de tecnologia empregada e, por conseguinte, do tipo de instrumento instalado. Podemos medir a vazão de maneira direta ou de maneira indireta, a depender do tipo de fluido e do estudo de viabilidade técnica e econômica. Uma maneira mais comum na indústria é a medição por elementos deprimogênios, aqueles que geram uma diferença de pressão. Neste caso, o elemento sensor mais usual e de baixo custo, em relação a outros medidores de vazão, é a placa de orifício. Ao utilizarmos este elemento sensor, precisamos medir a pressão diferencial gerada e relacionarmos esta com a vazão. Vamos estudar a relação entre a pressão diferencial e vazão, observando a malha de medição da Fig. 1.

Fig. 1: Malha de medição de vazão com placa de orifício
De acordo com a norma ISA 5.1, a simbologia empregada foi:
  1. FE - Elemento sensor de Vazão (no caso, Placa de Orifício);
  2. FIT - Transmissor Indicador de Vazão;
  3. FY - Extrator de Raiz Quadrada (símbolo superior à direita diz a função deste instrumento); e
  4. FI - Indicador de Vazão.

Ainda tomando a norma como referência, a placa de orifício, o transmissor de vazão e o extrator de raiz quadrada estão no campo, na área industrial. Já o indicador de vazão está na sala de controle e é acessível ao operador. O sinal dos instrumentos é elétrico (linhas pontilhadas) e seu valor varia de 4 a 20 mA (sinal padrão de corrente elétrica na instrumentação). E o transmissor é interligado ao processo por meio de tomadas de impulso à montante (entrada da placa de orifício) e à jusante (após a placa de orifício). Além disso, com o avanço tecnológico dos instrumentos eletrônicos, para facilitar o entendimento, o extrator de raiz quadrada está inserido no transmissor indicador de vazão e por isso, ambos estão com a cor vermelha.
Agora, não relacionadas à norma, inseri umas nomenclaturas para ajudar na explanação, como segue:
  1. EFIT: Entrada do transmissor indicador de vazão;
  2. SFIT: Saída do transmissor indicador de vazão;
  3. EFY: Entrada do extrator de raiz quadrada;
  4. SFY: Saída do extrator de raiz quadrada;
  5. EFI: Entrada do indicador de vazão; e
  6. SFI: Saída do indicador de vazão.

É possível perceber que há cores repetidas porque, por exemplo, o valor da corrente na saída do transmissor (SFIT) é igual ao valor da corrente na entrada do extrator de raiz quadrada (EFY). Analogamente para as outras cores.

A relação matemática entre a vazão e a diferença de pressão não é linear e é resumida na equação da Fig. 2.

Fig. 2: Relação matemática entre a vazão e a diferença de pressão
Onde Q é a vazão do processo, Δp é a pressão diferencial e K é um fator que relaciona a vazão máxima e a pressão diferencial máxima do processo e pode ser calculado como mostra a Fig. 3, para a malha de medição em questão.

Fig. 3: Cálculo do fator K

Uma vez que conhecemos as variáveis da equação que relaciona a vazão e a pressão diferencial, podemos calcular  qualquer valor de vazão ou de pressão diferencial dentro das suas respectivas faixas nominal da malha de medição em questão. Como exemplo, se a vazão do processo for 5 m³/h, qual o valor da pressão diferencial medida pelo transmissor? A reposta está na Fig. 4.

Fig. 4: Exemplo de cálculo da pressão diferencial
Podemos verificar que a vazão varia na razão exponencial em relação à pressão diferencial. Assim, a tabela a seguir, Fig. 5, mostra os valores da vazão e da pressão diferencial, em percentual.

Fig. 5: Tabela da relação entre vazão e pressão diferencial em %
É possível perceber que, para uma pequena variação de pressão diferencial, há uma grande variação na vazão. Ao plotarmos um gráfico, Fig. 6, verificamos a relação exponencial das grandezas em estudo, em unidade de engenharia.

Fig. 6: Gráfico da relação matemática entre as grandezas

Assim, quando a pressão diferencial varia conforme a tabela da Fig. 7, temos um gráfico de resposta da vazão mostrado na Fig. 8, sendo utilizada unidade de engenharia em ambas.

Fig. 7: Variação das grandezas em unidade de engenharia

Fig. 8: Gráfico da variação da vazão e da pressão diferencial

Percebemos, nas últimas figuras que uma variação de 50% (5 m³/h) na vazão do processo, provoca uma pressão diferencial de 25% (100 kPa) no transmissor. Mas o transmissor é calibrado e/ou ajustado pela vazão ou pela pressão diferencial? Apesar da simbologia indicar que o transmissor é de vazão, este não faz a medição direta desta grandeza. Como é possível verificar na malha, o transmissor mede a pressão diferencial do processo provocada pela passagem do fluxo (vazão) do fluido. Assim sendo, o transmissor deve ser calibrado e/ou ajustado em função da faixa nominal da pressão diferencial, como mostram as figuras 9 e 10.

Fig. 9: Tabela que relaciona a entrada e a saída do transmissor de pressão diferencial
Percebam que a entrada do transmissor é o valor da faixa nominal da pressão diferencial do processo.

Fig. 10: Gráfico da relação entre a entrada e a saída do FIT

O ideal seria trabalharmos com valores lineares porque são mais fáceis de entender e de trabalhar. É possível linearizar o valor da vazão nesta malha de medição? A resposta é sim. Entra em cena o extrator de raiz quadrada. Antes, porém, é preciso mostrar como este bloco matemático, inserido no circuito eletrônico do transmissor, faz o cálculo do valor de saída quando recebe valores de entrada originados do FIT. A Fig. 11 nos mostrará a equação válida para o sinal padrão de 4 a 20 mA.

Fig. 11: Equação do sinal de saída do extrator de raiz quadrada
Assim, apenas para exemplificar, se o transmissor envia um sinal de 8 mA para a entrada do FY, qual é o valor do sinal de saída deste instrumento? Veja a Fig. 12.

Fig. 12: Exemplo de cálculo do FY

É possível, então, relacionarmos os valores de corrente elétrica enviados pelo FIT (SFIT) para a entrada do FY (EFY) com os valores da saída do FY (SFY), conforme tabela da figura 13, e plotarmos um gráfico como mostra a Fig. 14.

Fig. 13: Relação da entrada e da saída do extrator de raiz quadrada

Fig. 14: Gráfico da entrada e da saída do FY

Parece que a curva deste gráfico já apareceu neste artigo! Perceberam??? Vejam direito.

Sim, esta curva já apareceu aqui. Vejam o gráfico da Fig. 8. É a mesma curva!!! Só mudou a cor....😬😬😬. Coincidência? Nada disso. A entrada do FY, que recebe o sinal da saída do transmissor, varia em função dos valores da pressão diferencial, mas esta pressão não é linear com a vazão. Assim, precisamos, matematicamente, gerar uma curva igual a da Fig. 8 na entrada do indicador de vazão de modo que a vazão que passa pelo processo, medida pelo sistema, tenha uma curva linear no indicador de vazão instalado na sala de controle. Vejamos a tabela da Fig. 15 e seu gráfico na Fig. 16. 

Fig. 15: Relação entre a entrada e a saída do indicador de vazão

Fig. 16: Gráfico que mostra a linearidade da vazão no indicador de vazão

Bingo! O indicador de vazão (FI) tem uma faixa nominal linear na sua saída (SFI) em relação à vazão (Q) do processo. Isto só foi possível porque no transmissor indicador de vazão a função matemática de extração de raiz quadrada foi habilitada e o indicador de vazão, na sala de controle, foi configurado para faixa nominal linear.

Também podemos configurar os instrumentos desabilitando a extração de raiz quadrada do FIT, porém precisamos mudar a faixa nominal do FI para escala quadrática. Vamos analisar o gráfico da Fig. 17.

Fig. 17: Relação entre as escalas linear e quadrática de instrumentos
No eixo X, está a variação de corrente elétrica de 4 a 20 mA e no eixo Y, a variação percentual de 0 a 100%. A curva azul é a escala linear e a cor laranja é a escala quadrática. Vejam que para uma corrente de 8 mA, o instrumento indicador ou registrador com escala linear mostrará 25% da sua faixa nominal, enquanto que um instrumento configurado com a escala quadrática exibirá 50% da sua faixa nominal. Mais um exemplo: ao receber 16 mA, o instrumento configurado para escala linear exibirá 75% da sua faixa nominal, enquanto o instrumento configurado com escala quadrática exibirá 86,6%. 

Tomem cuidado na configuração dos instrumentos da malha de vazão com elemento deprimogênio. Instrumento que transmite está habilitado o extrator de raiz quadrada, o instrumento receptor deve ser configurado com a escala linearInstrumento que transmite NÃO está habilitado o extrator de raiz quadrada, o instrumento receptor deve ser configurado com a escala quadrática.

É isso. Por hoje é só. Tudo de bom a todos!

sábado, 24 de fevereiro de 2018

Analisador Industrial por Absorção de Infravermelho - Monitoramento de Emissão de Gases

Imaginem uma indústria emitindo gases na atmosfera 24 horas por dia. O controle da  emissão de poluentes é um dos mais importantes em qualquer tipo de indústria, pois, além de multas pesadas dos órgãos fiscalizadores, o meio ambiente - não esqueçam que estamos inseridos - deve ser preservado, visando a sustentabilidade ambiental para nossas próximas gerações, assim como, a imagem da empresa também deve ser preservada em função dos processos normativos de qualidade.

Então, como a indústria monitora, controla e atua para melhorar suas emissões de efluentes líquidos e gasosos?

Além de investir na modernização de seu parque industrial, as empresas utilizam analisadores industriais que atuam diretamente nas variáveis analíticas de uma planta industrial. Hoje, vamos conversar sobre um tipo de analisador que é comum nas indústrias.

O analisador por absorção de radiação infravermelho (IV) é um instrumento que permite determinar, de forma contínua, em linha, a concentração de um componente em uma mistura de gases. A detecção da concentração do gás é específica, baseada na propriedade que possuem os gases de absorver, de forma seletiva, a energia de um feixe de radiação infravermelho. Desta forma, para um determinado tipo de gás puro, somente certas faixas do comprimento de onda de radiação IV são absorvidas. Como disse, a interação da radiação infravermelha com a matéria depende do comprimento de onda. A Fig. 1 mostra a divisão do espectro da radiação infravermelha.

Fig. 1: Faixa do Espectro da Radiação Infravermelha

O espectro da radiação IV divide-se em :
  • IV Próximo: comprimento de onda de 0,8 a 1,5 µm. Seu o comportamento é igual ao da luz visível;
  • IV Intermediário: está situado na faixa de 1,5 a 15 µm. Apresenta propriedades específicas, por isso, é a faixa que a operam os analisadores usuais; e
  • IV Longínquo: está situado na faixa de 15 até 1 000 µm e tem aplicação muito especializada.
Como se dá a vibração das moléculas?
Para um melhor entendimento, vou representar aqui as moléculas como esferas, com massa proporcional à massa atômica e as ligações moleculares como molas. É um modelo mecânico que melhor representa a vibração molecular. Na Fig. 2, podemos ver o modelo mecânico do gás carbônico (CO2).

Fig. 2: Modelo Mecânico da Vibração Molecular do Dióxido de Carbono

Assim, massa atômica de cada átomo (massa atômica do carbono é 12 e do oxigênio é 16) está representada por esferas de massa proporcional. A força da ligação química entre os átomos está representada pela mola que une as esferas. Ao deslocarmos axialmente as esferas de oxigênio, mantendo a esfera de carbono fixa, o modelo entra em oscilação obedecendo a um movimento harmônico simples, como visto na Fig. 2 A. No segundo movimento, Fig. 2 B, a esfera de carbono vai ao encontro das esferas de oxigênio, ainda no sentido axial (eixo x) e, por fim, o terceiro movimento, Fig. 2 C, as esferas se movimentam no sentido do eixo y, para cima e para baixo. Vale lembrar que a frequência da vibração molecular depende da massa dos átomos, assim como da magnitude da força de ligação química. Desta forma, quanto maiores as massas e menor a força, menor a frequência de oscilação. Para uma molécula diatômica, por exemplo, só é possível um tipo de vibração: na direção do eixo x, ou seja, na direção da linha que une os dois átomos. Entretanto, para moléculas com maior número de átomos, são possíveis outros tipos de vibrações simultâneas, como mostradas na Fig. 2.

Após a explicação acima, é possível afirmar que a molécula de dióxido de carbono (CO2) possui três padrões de vibração, que podemos ver na Fig. 3. Mas, e os movimentos translacional e rotacional? Toda molécula de um gás apresenta, pelo menos, estes dois movimentos, além do movimento vibracional. No entanto, apenas o movimento vibracional está relacionado com a absorção de radiação IV nos analisadores, porque a frequência de emissão de IV intermediário entrará em ressonância com o padrão de vibração de cada gás, dentro do comprimento de onda IV.

Fig. 3: Gráfico do Espectro de Absorção de IV do Dióxido de Carbono

E como ocorre a absorção de radiação infravermelha pelos gases?
Sabemos que as moléculas de qualquer gás, com temperatura acima do zero absoluto, estão em contínuo movimento, seja de translação, rotação ou vibração. A energia interna do gás é exatamente a somatória dessas energias cinéticas, enquanto o nível médio energético de cada molécula está relacionado com a temperatura do gás. Quando o movimento vibracional da molécula é tal que os centros de cargas positiva e negativa dos átomos apresentam uma discordância durante o movimento oscilatório, isto é, quando é formado um momento dipolar, a molécula emite radiação eletromagnética na faixa do infravermelho.

Como exemplo, novamente vejamos a Fig. 2. O modo vibracional da molécula de CO2 em A, não emite radiação, pois o movimento dos átomos não cria nenhum momento dipolar. Já os movimentos B e C emitem radiação infravermelha. As moléculas de gases homo atômicos, tais como O2, H2, N2, entre outras, também não emitem radiação devido à simetria que impede a criação do momento dipolar enquanto vibram. No entanto, as moléculas heteroatômicas, como CO2, H2O, CH4, entre outras, emitem radiação infravermelha, pois a falta de simetria lhes garante a geração do momento dipolar. E pode-se afirmar que o fenômeno de emissão de radiação infravermelha pelas moléculas é perfeitamente reversível, isto é, se um gás, a temperatura ambiente, for atravessado por um feixe de radiação eletromagnético que contenha o espectro infravermelho, absorverá desse feixe àquela parte que corresponde à frequência natural de oscilação de suas moléculas. Lembram-se das aulas de física no ensino médio? Chamamos este fenômeno de ressonância. Como cada molécula possui um padrão único de absorção de radiação infravermelho, essa propriedade funcionará como uma verdadeira "impressão digital", servindo para identificar o gás em questão de formas qualitativa e quantitativa. A redução da energia de um feixe de radiação eletromagnética devido à absorção de radiação infravermelha obedece à lei de Lambert-Beer, como mostra a Fig. 4.


Fig. 4: Equação da lei de Lambert-Beer

Sendo:
I - Intensidade do feixe após atravessar a substância;
I0 - Intensidade do feixe no mesmo ponto, porém sem a substância absorvente;
a - Fator de absorção que depende da substância absorvente e do comprimento de onda
da radiação;
b - Distância percorrida pela radiação na substância;
c - Concentração da substância.

Então, como funciona um analisador de gás por absorção do IV?
Nas Fig. 5 A e B, a seguir, vemos a estrutura básica de funcionamento de um analisador por absorção de IV, que nos permite praticar o que lemos até agora.

Fig. 5 A: Estrutura Típica de um Analisador com Nitrogênio

Na Fig. 5 A, um gás não absorvente de radiação IV, nitrogênio por exemplo, preenche a câmara de análise. Toda radiação emitida pela fonte IV é recebida pelo detector, uma vez que não há absorção de IV pelo gás na câmara de análise.

Já na Fig. 5 B, o gás a ser analisado – por exemplo, o dióxido de carbono, CO2 – preenche a câmara de análise e absorve parte da energia emitida pela fonte IV. Assim, detector recebe menos radiação do que no caso anterior. O detector gera um sinal elétrico, em mV, proporcional à intensidade do feixe de radiação incidente.


Fig. 5 B: Estrutura Típica de um Analisador com Dióxido de Carbono


Pela lei de Lambert-Beer, pode-se verificar que o sinal do detector é proporcional a "I", variando somente com a relação "c", que é a concentração da substância em análise. As grandezas "I0", "a" e "b" são constantes, pois dependem das características físicas do analisador e da substância a ser analisada.

Certo, mas se a fonte emitisse IV em toda faixa do IV intermediário e o detector detectasse a radiação IV nesta faixa, como saberíamos qual gás o analisador estaria medindo? Como garantir a seletividade dos gases pelo analisador?

Como já foi explicado, cada gás tem seu padrão de absorção de radiação, como se fosse uma impressão digital do gás. Vejamos, na Fig. 6, o gráfico padrão de absorção de IV dos gases CH4 e C2H6. Desta forma, a seletividade de um analisador infravermelho é conseguida limitando-se o espectro de radiação a um intervalo que seja coincidente apenas com o padrão de absorção do gás a ser analisado.


Fig. 6: Gráfico de absorção de IV dos gases metano e etano

Tipos de analisadores
Encontramos, no mercado, duas categorias de analisadores por absorção de radiação IV – os analisadores do tipo dispersivo, também chamados de espectrofotômetros e os analisadores do tipo não dispersivo, também chamados de fotômetros. Os espectrofotômetros são instrumentos de laboratório e fornecem como resultado o espectro de absorção de radiação de uma substância. O termo dispersivo advém do fato de que o feixe de radiação, após atravessar a substância em análise, é disperso por um prisma ou uma grande difração. Um mecanismo faz com que somente uma faixa muito estreita do feixe dispersa atinja o detector, permitindo assim que seja explorado, ao longo de todo espectro, o poder de absorção de radiação da substância em função do comprimento de onda. Já os analisadores do tipo não dispersivos são utilizados universalmente em processos industriais, podendo ser encontrados também em laboratórios. Permitem determinar a concentração de uma única substância ao longo do tempo e de forma contínua.

Vamos estudar os fotômetros?
Os analisadores do tipo não dispersivos que são utilizados em processos industriais podem ser classificados em analisadores de filtragem negativa e em analisadores de filtragem positiva.

Analisador Não Dispersivo – Filtragem Negativa
A Fig. 7 mostra um esquema típico de construção deste tipo de analisador.

Fig. 7: Construção Típica do Analisador Fotômetro - Filtragem Negativa
Neste tipo de analisador, a radiação emitida pela fonte atravessa a câmara de análise, separa-se e atravessa os dois filtros e, finalmente, incide em dois detectores. O filtro 1 é uma câmara selada com o mesmo tipo de gás a ser analisado, por exemplo, CO2. O filtro 2 é preenchido com um gás não absorvente de infravermelho, por exemplo, N2. Se o gás que atravessa a câmara de análise é não absorvente de IV, o detector D2 recebe o máximo de radiação da fonte, ao passo que a radiação incidente no detector D1 é menor em relação ao outro detector, pois o filtro F1, preenchido com o gás a ser analisado, absorve parte do espectro infravermelho. Neste caso, a temperatura do detector 2 é maior do que a temperatura do detector 1. No entanto, quando o gás a ser analisado atravessa a câmara de análise, o detector D2 recebe menos radiação, enquanto o detector D1 permanece com a mesma radiação. A temperatura nos dois detectores será igual. Os detectores, que são termopares, geram uma tensão, em mV, proporcional à sua temperatura. A diferença de potencial entre os detectores, diretamente proporcional à diferença de temperatura dos detectores, será amplificada e tratada na unidade eletrônica do analisador e representará a concentração de gás a ser analisado.

Para melhorar o entendimento, vejamos as Fig. 8 A e B. O analisador foi preparado para analisar o dióxido de carbono (CO2). A faixa nominal a ser analisada é de 0 a 2% de CO2, apenas como exemplo da explicação.

Fig. 8 A: Analisador tipo Filtragem Negativa sem Dióxido de Carbono

Na Fig. 8 A, a mistura a ser analisada é composta de 100% de N2. Não tem dióxido de carbono. O filtro F1 contém o CO2 numa concentração de 2%. O filtro 2 é preenchido com nitrogênio que não absorve a radiação IV. Ao atravessar a câmara de análise, a mistura gasosa, composta apenas de nitrogênio, não absorverá radiação IV. Os feixes de IV chegarão aos filtros. No filtro 1, haverá absorção de IV, no comprimento de onda correspondente ao CO2, logo haverá uma incidência menor de radiação no detector 1 que gerará uma tensão, em mV, proporcional à temperatura desta incidência de radiação. Já no filtro 2, não haverá absorção da radiação IV e toda radiação oriunda da fonte de IV incidirá no detector 2, fazendo com que a temperatura seja maior do que a temperatura no D1 e este gerará uma tensão, também em mV, proporcional a esta temperatura. A diferença de potencial elétrico, em mV, é tratada na unidade eletrônica do analisador. No caso em tela, o analisador mostrará 0% de CO2 na mistura gasosa.

Então, podemos concluir que, quando a diferença de temperatura entre os detectores for a maior possível, ou seja, quando TD2 for maior do que TD1, a mistura gasosa não tem o gás a ser analisado, que no nosso caso é o dióxido de carbono. Quando esta diferença de temperatura for diminuindo, significa que a concentração do gás a ser analisado está aumentando na mistura gasosa. Assim, quando a temperatura em cada detector for igual, significa que o gás a ser analisado atingiu o valor da concentração a qual o analisador foi configurado. Vejamos a Fig. 8 B e sua explicação.

Fig. 8 B: Analisador tipo Filtragem Negativa com Dióxido de Carbono


Na Fig. 8 B, a mistura gasosa agora é composta de 2% de CO2 + 98% de N2. Ao atravessar a câmara de análise, a mistura gasosa, desta vez, absorverá radiação IV, no comprimento de onda do CO2 presente na mistura. No filtro 1, não haverá absorção de IV, uma vez que isso já ocorreu na câmara de análise, logo haverá mesma incidência de radiação no D1 que não vai alterar a temperatura deste detector. E no filtro 2, não haverá absorção da radiação IV, mas uma incidência menor de radiação IV o atravessará já que ocorreu a absorção na câmara de análise. Daí, a temperatura no detector D2 diminuirá em relação ao caso anterior, até ficar igual à temperatura do D1. Como no caso anterior, haverá um tratamento do sinal elétrico e o analisador indicará 2% de CO2.

Não é interessante?

É importante destacar que a fonte de IV, assim como qualquer componente eletrônico, diminui sua eficiência ao longo do tempo. Porém, em função da sua construção, os efeitos serão sentidos pelos dois detectores, compensando esta diminuição de incidência de IV.

Caso haja outro gás que absorva IV na mistura a ser analisada e seu espectro de absorção não coincida em nenhum ponto com o gás a ser analisado, também haverá uma compensação dos efeitos uma vez que os dois detectores receberão incidências iguais.

E o Analisador Não Dispersivo – Filtragem Positiva? Quais as diferenças?
A Fig. 9 mostra um esquema típico de construção deste tipo de analisador.


Fig. 9: Construção Típica do Analisador Fotômetro - Filtragem Positiva


A diferença básica construtiva relação ao de filtragem negativa refere-se à divisão da radiação emitida pela fonte IV em dois feixes paralelos: um para a câmara de análise e outro para a câmara de referência, e os filtros e os detectores que estão no mesmo invólucro. Como podemos ver na Fig. 9, o primeiro feixe atravessa a câmara de análise e incide no detector D1, que consiste em uma câmara preenchida com gás idêntico ao que será analisado pelo analisador. A temperatura desse gás é medida e um sinal de saída, em mV, é enviado à unidade eletrônica do analisador. O segundo feixe atravessa uma câmara de referência e incide no detector D2, idêntico ao D1. A câmara de referência é preenchida com um gás que não absorve IV. Quando, na câmara de análise, estiver circulando um gás não absorvente de radiação infravermelha, os dois feixes incidem com espectro integral nos dois detectores, elevando a temperatura do gás contido em seus interiores a um valor máximo e idêntico. A diferença de potencial elétrico entre os sinais de D1 e D2 é amplificada, tratada e o analisador indicará a concentração de 0% do gás a ser analisado. No entanto, se na câmara de análise estiver presente o gás a ser analisado, a temperatura do gás no detector D1 diminuirá, pois, a radiação que nele incide estará sem a parcela parcial ou total da parte do espectro correspondente ao gás a ser analisado presente na mistura gasosa. É importante observar que o aquecimento do gás contido nos detectores (gás a ser analisado) é promovido apenas pela parte do espectro relativo a este gás, enquanto que no analisador de filtragem negativa, o aquecimento é provocado pela totalidade do feixe de radiação do gás em análise.

Para finalizar, as nomenclaturas filtragem negativa e filtragem positiva podem ser interpretadas comparando-se a faixa do espectro absorvida pelos detectores dos dois tipos de analisadores. Assim, no analisador de filtragem negativa, os detectores absorvem radiação integral em toda a faixa do espectro emitido pela fonte, exceto nos comprimentos de onda correspondente ao padrão de absorção do componente analisado. Já no analisador de filtragem positiva, o detector absorve somente radiação correspondente ao padrão de absorção do componente analisado.

É isso por hoje. Agradeço a atenção de quem leu até aqui. Espero que o texto tenha contribuído para aumentar o conhecimento de vocês.

Tudo de bom e até o próximo artigo.

Mais visitadas